Sidney, estudante de geologia na USP, foi assaltado (e espancado) na semana passada numa das saídas de pedestre da USP e relatou sua história chocante em seu blog no Stoa. Vale muito a pena ler, inclusive os comentários onde se discute uma solução. O mais impressionante é o descaso da Guarda Universitária e da Polícia.
O último comentário até o momento (número 34) é sobre a entrada de pedestres que eu uso:
A coisa anda feia mesmo, hoje tentaram me assaltar praticamente na porta de casa. Isso porque moro a uns 20 metros de um portão de pedestres próximo ao da Vila Indiana (a portaria do mercadinho… nem todo mundo sabe onde fica) na Rua Francisco dos Santos. De uns meses para cá, os assaltos tem sido quase que diários.
Hoje tomei uma coronhada na boca e só não levaram as minhas coisas porque a rua estava cheia de testemunhas e um senhor ameaçou chamar a polícia. Realmente é preciso fazer alguma coisa, pois do jeito que está não pode ficar.
Apesar de saber que não surte muito efeito, peço para todos que foram atacados fazerem B.O.s, pois só assim ele podem mapear a área e verem que essa região está sendo muito visada.
Acordei às 06:30. Às terças eu tenho aula de Álgebra ás 08:00 e não queria perder essa, porque a professora ficou de corrigir minha nota. Peguei o circular às 07:35. Cheguei no IME às 07:45. Horário perfeito.
Porém, observei que as salas estavam fechadas e não havia alunos. Vi apenas seguranças, moças da limpeza e um ou outro professor. Perguntei para um segurança what the hell estava havendo. Ele informou que não tem aula na Semana Santa.
Lembrei-me que tinha ouvido algo sobre a Semana Santa na semana passada, mas não dei muita atenção. Acho que meu cérebro ignorou porque não viu sentido em emendar uma semana inteira por causa de um feriado na sexta. Pensei que deveria ter ido mais nas aulas semana passada que algum professor teria avisado. Mas tudo bem. Porque notei que felizmente a biblioteca estava aberta, logo minha ida ao IME não teria sido em vão.
Havia reservado um livro que seria devolvido anteontem chamado Matching Theory (László Lovász, M. D. Plummer). É um livro fora de circulação, raríssimo e que, segundo consultas na internet, só existe em duas bibliotecas no Brasil: a do IME-USP e a do IMPA.
Eu estou procurando este livro desde o início de março, quando ainda estava em Floripa. Reservá-lo foi uma das primeiras coisas que fiz quando cheguei no IME (logo depois de fazer a carteirinha na biblioteca, é claro). Estava extremamente feliz por finalmente poder tê-lo.
Então pedi o livro à moça. Ela deu uma olhada nos livros que tinham chegado. Disse que este livro não chegou e que nem via sentido em ele ter chegado na semana santa. Eu disse-lhe que deveria ter chegado no dia 05. Ela duvidou. Eu insisti pra ela olhar na ficha. Ela olhou, riu (da minha cara) e disse que o livro estava com um professor.
“E daí?”, pensei. “Os professores devem ter um tempo maior de entrega, e só. Certo?”
Não. Errado. Perguntei à moça se o professor tinha atrasado a devolução e ela respondeu dizendo que os professores não só tem um prazo maior como não precisam devolver o livro no prazo. Ora, para quê o prazo então?
Controlei-me e perguntei então qual é o professor que estava com o livro. Provavelmente é alguém do grupo de otimização combinatória (talvez o meu orientador de iniciação científica), eu poderia falar com ele pra tirar cópias. A moça respondeu que não pode dizer.
Excelente então, fico sem livro e sem previsão de quando o professor vai devolver, sem nem saber se o livro ainda existe. Talvez eu nunca consiga o livro. Quem sabe?
Educadamente agradeci e fui pegar o circular para voltar pra casa. Há cinco dias estou morando a 160m da Entrada do Mercadinho (i.e., 700m do ponto de circular mais próximo dentro da Cidade Universitária).
Quando estava quase chegando ao ponto de ônibus, vi o circular passando. Droga, mais uns 15 minutos de espera. Para não ficar sem fazer nada, resolvi ir andando.
A USP é enorme e tenho a impressão que andar com o Network Flows (Ahuja, Magnanti, Orlin) na mochila aumenta consideravelmente o seu tamanho.
Há ao menos duas maneiras de ir andando do IME pra minha casa. A primeira é o menor caminho, passando pela Rua do Matão (que não tem esse nome em vão, de fato fica no meio de uma selva). A segunda é o maior caminho, mas é pela civilização. Optei pela segunda.
Após três quilômetros e uns 30 minutos, cheguei (cansado) aqui (e, é claro, no meio do caminho outro circular passou por mim). Uma hora decididamente inútil. Acho que foi o meu trote.
Ao menos nunca mais me esquecerei que na USP não tem aula na Semana Santa.
Curiosamente as melhores aulas (em conteúdo e rigor matemático) que estou tendo no IME–USP neste semestre são as de Introdução à Probabilidade e Estatística I (MAE 121). Digo “curiosamente” porque
0. Nunca gostei de estatística (e acreditava que este seria o foco da disciplina);
1. Álgebra e Cálculo tem um conteúdo que acredito ser bem mais matemático;
2. Sinceramente, não esperava nada desta disciplina.
Surpreendi-me porque, de fato, desde que entramos na matéria de Probabilidade tudo até agora foi definido ou provado formalmente. Por exemplo, espaço de probabilidade é a tripla (Ω,F,P), onde Ω é o espaço amostral, F é uma σ-álgebra que representa o conjunto dos eventos e P:F→[0,1] é a função probabilidade. Com três axiomas em cima dessa definição provamos uma porção de coisas.
Muito interessante. A probabilidade é uma área que eu desconhecia completamente (e discriminava em pensamento por andar sempre junto com Estatística), mas que é muito mais legal (em nível matemático) do que eu pensava.
Em primeiro lugar quero afirmar aos desavisados que o curso de Ciência da Computação hoje é, na maioria dos lugares, não mais do que o estereótipo indica: um curso de viciados em jogos. Até aí tudo bem; afinal cada um faz o que bem entende nos seus momentos de lazer.
Porém, eu acho que esse fato colaborou para esse bacharelado se transformar num reduto de usuários de computador, pessoas que leram “Computação” no nome e pensaram: “Eu gosto de mexer no computador, acho que este é o meu curso”.
Se já sabemos que funciona, pra que provar?
A realidade que percebo nas turmas, tanto na UFSC quanto no IME-USP, é decepcionante. Quando um professor dá um curso mais forte e teórico, vários alunos se espantam e reclamam que o curso não está formando para a prática. Pior: em muitas universidades o curso está mudando de cara pra satisfazer estes estudantes e não o contrário, como deveria ser. O IME-USP ainda tem um curso excelente, mas advinhe o que os alunos da minha turma aprenderam na primeira matéria do curso (chamada de Introdução à Computação)? Java e programação orientada a objetos. Eles aprendem classes e métodos antes de aprenderem operadores lógicos e laços. Na única aula que fui da disciplina, o professor falava bem do Java porque as classes e métodos podem ter acentos!!!
A situação é tão desanimadora que às vezes penso que o nome do meu curso deveria mudar para não pegar desavisados que não procuram o que é antes de entrar. Deveria ser algo como Bacharelado em Ciência dos Algoritmos, Bacharelado em Matemática Discreta, que tal? Não sei. Mas é obviamente uma besteira: o que precisa mudar são as pessoas. Tanto as que entram no curso, quanto as pessoas em geral, que pedem favores pra cientistas da computação pensando que eles são técnicos de informática. As pessoas precisam entender o que é o curso antes de entrar nele, precisam saber que Ciência da Computação é um ramo da matemática que existe desde muito antes da criação dos computadores digitais.
O primeiro parágrafo do texto da Wikipedia em português sobre Ciência da computação diz (e juro que não fui eu que editei!):
Ciência da computação é o estudo dos algoritmos e suas aplicações, bem como das estruturas matemáticas indispensáveis à formulação precisa dos conceitos fundamentais da teoria da computabilidade e da computação aplicada. Desempenha por isso um papel importante na área de ciência da computação a formalização matemática de algoritmos, como forma de representar problemas decidíveis, i.e., os que são suscetíveis de redução a operações elementares básicas, capazes de serem reproduzidas através de um qualquer dispositivo mecânico/eletrônico capaz de armazenar e manipular dados. Um destes dispositivos é o computador digital, de uso generalizado, nos dias de hoje, pelo custo reduzido dos componentes eletrônicos que formam o seu hardware.
Se o Java já tem um heap implementado para que reinventar a roda?
Edsger Dijkstra, um dos grandes cientistas da computação de nossa história, disse certa vez:
Ciência da Computação está tão relacionada aos computadores quanto a Astronomia aos telescópios, Biologia aos microscópios, ou Química aos tubos de ensaio. A Ciência não estuda ferramentas. Ela estuda como nós as utilizamos, e o que descobrimos com elas.
É por tudo isso que abandono a sala ao ouvir que hoje em dia classes são mais importantes do que laços e nomear corretamente funções é mais importante do que conhecer algoritmos. (Sim, já ouvi isso de um professor dentro da universidade.)
Declaro-me a favor de um curso de Ciência da Computação onde os computadores sejam tratados apenas como ferramentas. Há outros cursos (técnicos) para quem não pensa assim e entra na universidade buscando uma formação sobre desenvolvimento ágil e produtividade. Não estou criticando quem busca isto. Porém, na minha opinião, estes definitivamente não deveriam entrar num curso chamado Bacharelado em Ciência da Computação.
Um de meus melhores professores conta que há muito tempo atrás houve um professor na UFRGS que, inconformado com a dificuldade de concentração de sua turma, parou de escrever no quadro por um tempo, virou-se para os seus alunos e disse:
As estatísticas mostram que apenas 3% de vocês vai aproveitar este curso. Ah, se eu soubesse quem são os 3% para dar aulas apenas para esses…
Fica a dica: Se você leciona ou for lecionar um dia e não aguentar a turma, esqueça os 97% e concentre-se em dar uma boa aula para os 3%. Você pode não vê-los, mas eles estão lá.